quinta-feira, 10 de dezembro de 2009

Visitas Impertinentes

Rosana fora nascida e criada em São Paulo, educada em uma escola de freiras, pouco contato teve com os perigos da vida, jamais saiu sozinha durante a noite, e nem nos tempos da faculdade se acostumou com as badalações.
Vivia em um apartamento no Morumbi, morava com sua mãe e com Doralice, sua irmã mais velha, seu pai havia suicidado há 16 anos, quando ainda era pequenina. Doralice era o oposto de sua irmã, boa vivã, sempre aproveitou a vida ao extremo, teve muitos namorados e conheceu vários lugares
Apesar do tamanho e do alto índice de criminalidade de São Paulo, a família Vieira nunca tinha sofrido com violência, Rosana e Dalva, sua mãe, sempre tomaram todos os cuidados quanto à isso, mas Doralice...
Era uma manha de domingo, o relógio apontava nove horas, e Doralice ainda não havia chegado em casa, e para aumentar o desespero da família o seu celular estava desligado. Claro que Rosana e Dalva pensaram o pior, e infelizmente o sentido feminino das duas estava certo. Doralice estava saindo da boate “Night Bórium” quando foi alvejada mortalmente por uma bala perdida.
Depois de vários meses de puro desespero as sobreviventes da família Vieira resolveram se mudarem de São Paulo, havia uma tia de Dalva que morava no interior, mais especificamente em Jaboticabal. Venderam o apartamento no Morumbi e uma casa antiga que tinham na Avenida São João e com o dinheiro das negociações compraram uma fazenda na cidade de destino.
A adaptação à vida interiorana foi fácil para as duas, pois aquele espírito pacato de Rosana tinha sido herança de sua mãe, que foi criada no interior. Acordavam bem cedo para ordenhar as vacas e ajudar Seu João a pastorar as ovelhas, tiravam da lã e do leite o sustento da fazenda. À cidade iam apenas aos finais de semana, para fazer compras e almoçar em algum restaurante de comida mineira.
Nos domingos a dor pela perda de Doralice aumentava, durante a semana ainda conseguiam disfarçar tal sofrimento, mas o domingo guardava uma ressaca de melancolia que se espalhava por toda a fazenda, nem a roda de viola que Seu João organizava amenizava a dor.
Havia dias que Rosana não conseguia dormir, barulhos macabros estavam assombrando a velha casa de assoalho. Era inevitável, todos os dias quando o relógio da sala marcava três horas da manhã em ponto, podia-se ouvir vários passos na cozinha, panelas caindo e gruídos que assemelhavam-se à risadas.
No início Rosana pensava ser sua irmã que à vinha visitar, pois a madrugada era o momento do dia preferido de Doralice. Levantava-se e ia até a cozinha tentar contato, mas tudo que encontrava era um cenário totalmente desarrumado, com comida e panelas pelo chão. Dalva também não deixara de observar aqueles acontecimentos estranhos, e passou a ter dificuldades para dormir.
Histórias não faltavam, ouviram dizer que um antigo dono do sítio havia se enforcado na mangueira do quintal - cortaram a mangueira! Também disseram que um capitão do mato tinha esquartejado um escravo fujão na casa de madeira que se localizava à direito da casa principal - derrubaram a casa! Disseram também que uma garotinha havia se afogado no rio que passa rente à fazenda, mas do rio não podiam se livrar!
Chamaram padres, pastores, bezendeiras, pais e mães de santo, mas ninguém resolveu a situação, pelo contrário, cada visita só aumentava os barulhos.
Como nem os religiosos conseguiram resolver o problema, as duas decidiram resolver por si próprias, passaram a dormir na sala, e toda vez que o relógio marcava três da manha saiam correndo em direção à cozinha, e não encontravam absolutamente nada! “Esse espírito é realmente muito ágil” pensavam as duas intregadas.
Seguindo o conselho de Dona Dulce, tia de Dalva, começaram a dormir na próprio cozinha, e Dulce estava certa, se aproximando do território inimigo há mais chances de encontrá-lo.
Já na segundo noite que dormiram no local, Rosana foi atacada pela entidade maligna. Estavam as duas deitadas ao lado da mesa de sucupira, quando Rosana sentiu algo passeando sobre seu corpo, como se fossem pequenos dedos lhe massageando a pele macia, no inicio pensou ser sua mãe, mas quando fitou sua barriga enxergou dois olhos vermelhos arregalados lhe encarando. Deu um grito imenso acordando toda a fazenda, sua mãe aterrorizada levantou em um pulo já com a espingarda em mãos!
Talvez Rosana e Dalva preferissem que fossem realmente almas penadas que estivessem assombrando a casa, mas era muito pior aos olhos delas, o que diziam ser espíritos não passavam de pequenos roedores que iam à cozinha durante a noite para assaltar os restos de pães que ficavam sobre a mesa...


Jordano Souza

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